25 fevereiro 2008

Brasil, pela primeira vez, passa a ser credor externo

A soma dos ativos brasileiros no exterior (constituídos fundamentalmente pelas reservas internacionais) superou o valor da dívida externa do país, pela primeira vez em sua história. Segundo o relatório Focus, do Banco Central, em 2003, a dívida superava os ativos em US$ 165,2 bilhões. Em 2007, essa diferença, por estimativa, cai para US$ 4,3 bilhões. E, em janeiro deste ano, a posição se inverte e são os ativos que superam a dívida externa em mais de US$ 4 bilhões.

O resultado obtido decorre das políticas macroeconômicas adotadas e da liquidez internacional que permitiu o ingresso de divisas no País. O relatório destaca ainda o bom desempenho das empresas exportadoras e os resultados recordes da balança comercial como fatores cruciais para a melhora na posição internacional do País.

As reservas internacionais tiveram “evolução sem precedentes” nos últimos anos, de acordo com o relatório. Subiram de US$ 16,3 bilhões, em 2002, para US$ 180,3 bilhões, no final de 2007. Apenas no ano passado, cresceu 110%.

Os ingressos de capitais também foram recordes. Alcançaram a cifra de US$ 88,2 bilhões em 2007. Na avaliação do Banco Central, esses ingressos foram bem distribuídos entre Investimentos Estrangeiros Diretos (IED), em carteira e outros. Os ingressos líquidos de IED atingiram o maior montante da série histórica, US$ 34,6 bilhões, mais que o dobro dos valores observados em 2002. Já os investimentos estrangeiros em carteira foram conseguidos graças ao desenvolvimento do mercado acionário brasileiro, o reforço das regras de governança corporativa e o estímulo à capitalização acionária por meio de ofertas públicas de ações.

Os dólares vindos dos investimentos e dos superávits (obtidos desde 2003) permitiram ao Brasil acumular reservas e também reduzir o montante da dívida. Em 2005, por exemplo, o governo brasileiro liquidou seu passivo com o FMI (Fundo Monetário Internacional).

... esses bons indicadores tornam o país mais resistente às crises externas.

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Editado pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República
Nº 608a - Brasília, 22 de Fevereiro de 2008


(Para juntar Tico e Teco)

A História da Dívida Externa Brasileira
NF Online / Abril 2004
Alex Oliveira Rodrigues de Lima*

Muito se tem falado do endividamento brasileiro, mas sempre surgem lacunas quando se estuda este aspecto da história brasileira. Assim, apresento esta breve síntese da economia brasileira.
De 1580 a 1640, o rei Filipe da Espanha governou Portugal. Somente em 1641 a Inglaterra patrocina a re-independência de Portugal. Obriga a criação uma taxa ad valorem 2% nos portos ingleses (produtos ingleses melhor qualidade e mais caros) e 14% no porto português. Portugal exportava bacalhau, vinho, cortiça, azeitona e óleo, importando produtos manufaturados da Inglaterra. Mês a mês a balança comercial ficava negativa para Portugal, e o seu endividamento aumentava.
Em 1703 foi assinado o Tratado de Metwin, de proteção militar em troca de pagamento, entre o império britânico e Portugal, que não tinha poder militar para proteger suas colônias. Durante mais de cem anos (1690 até 1822), todo o ouro brasileiro de Goiás e Minas Gerais, e todo o diamante da cidade mineira de Tijuco Preto (atual Diamantina), foi diretamente para a Inglaterra, capitalizando-a.
O Brasil durante a sua independência foi obrigado a assinar tratado de comércio e navegação com a Inglaterra, como conditio sine quae non para apoio à guerra da independência. Portugal exigiu vultuosa indenização, para liberar o Brasil de ser sua colônia. A Inglaterra, para não perder a dominação, paga a indenização à Portugal e o Brasil vira devedor em libras esterlinas, agravando a dependência econômica e o endividamento externo.
Para aumentar o endividamento, D.Pedro II, solicitou empréstimos à Inglaterra para financiar a Guerra do Prata (visando o trigo do Uruguai e o gado da Argentina e Paraguai). Aproximadamente 100 mil brasileiros foram mortos, de um exército composto por 200 mil brasileiros em guerra (maior efetivo que o exército atual). Com a vitória brasileira, a Inglaterra vetou a anexação destes territórios. O Brasil venceu a guerra e não levou nada, só aumento de sua dívida.
Com a proclamação da república, ocorreu durante três anos, a chamada, Política do Encilhamento, do ministro da justiça e fazenda, Rui Barbosa. Como não havia mercado interno no Brasil, ele queria uma rápida evolução do mercado. Assim, os bancos poderiam emitir moeda (máquinas de tipografia inglesa vinham de navio). Qualquer contrato social registrado em junta comercial, permitia levantar um empréstimo do valor constante do capital. Infelizmente, a malandragem imperou e nenhuma empresa foi criada, para o desenvolvimento nacional. Os bancos faliram e incêndios criminosos destruíram os arquivos das Juntas Comerciais. Ocorreu um prejuízo colossal ao Brasil, aumentando o endividamento interno e externo. Rui Barbosa foi acusado de corrupto, e responsável pelo maior escândalo da história econômica do mundo, gerando famílias do Rio de Janeiro milionárias, até os dias de hoje. Em 1910, Hermes da Fonseca, venceu Rui Barbosa nas eleições presidenciais.
Em Agosto de 1914, iniciou-se a 1a. Guerra Mundial. Os Estados Unidos, querendo que a guerra durasse muito tempo, vendeu armas para a tríplice aliança e para intante cordiale. Toda sua indústria foi convertida para bélica (v.g. guarda-chuva=fuzil, carro=tanque, baton=cartucho). Pensando que a guerra acabaria em 1925, os Estados Unidos se viram frustrados com seu final em novembro de 1918, pois não levaram em consideração o marxismo russo (março e out de 1917) e alemão (1918 duas revoluções marxistas - Rosa de Luxemburgo e abdicação do kaiser em 7 de novembro, que tiraram a Alemanha da guerra externa).
Com a Europa exaurida não havia mais necessidade da indústria armamentista. Milhões de desempregados surgiram nos Estados Unidos, pois as indústrias, convertidas para bélica, ficaram paradas.
Para não entrar em crise os Estados Unidos resolveram enganar o mundo utilizando a bolsa de valores para fintar os países.
A ação tem 3 valores:
1. NOMINAL (valor de face em dólares)
2. ECONÔMICO (mercado, tecnologia e diretrizes)
3. ESPECULATIVO (valor de bolsa)
Os Estados Unidos, aumentaram artificialmente o terceiro valor (especulativo) e enganaram o mundo, pois todas as suas empresas estavam falidas. O Brasil, de 1920 a 1929, visando maximizar seus lucros, entrou na bolsa americana, com o dinheiro dos cafeicultores de São Paulo.
Em 1929, ocorre o crack da Bolsa de Wall Street, e em uma semana, todas as ações viraram pó. Os Estados Unidos ficaram ricos, reaplicando o dinheiro investido em seu parque industrial, enquanto que o mundo faliu.
Como o Brasil perdeu tudo em 1929, surgindo Getúlio Vargas, com a política anti-cafeeira, queimando todos os cafezais paulistas, transformando São Paulo em uma grande fogueira (o que gerou a revolução constitucionalista de 09 de julho de 1932).
Em 1942 o Brasil assina o Tratado do Rio de Janeiro, saindo da dependência da Inglaterra e entrando na dependência capitalista dos Estados Unidos. O Brasil, perdeu a identidade cultural para a americana (escola, família e alimentação). Várias empresas norte-americanas entram no país.
Em 1955, o coronel médico J.K. assume a presidência e viaja para a Europa. Em plena guerra fria, atemorizada pela URSS, a Alemanha, resolve atender ao convite de J.K, instalando vinte empresas no Brasil. Este parque industrial alemão, gerou um milhão de empregos diretos e espalhou uma rede de concessionárias pelo país. Com o fim da guerra fria, a Alemanha perde o interesse no Brasil e passa a investir na Argentina...
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* Alex Oliveira Rodrigues de Lima é doutor em direito.

19 fevereiro 2008

Mensaje del Comandante en Jefe



Fidel Castro Ruz
18 de febrero de 2008
Mensaje del Comandante en Jefe
Queridos compatriotas:
Les prometí el pasado viernes 15 de febrero que en la próxima reflexión abordaría un tema de interés para muchos compatriotas. La misma adquiere esta vez forma de mensaje.

Ha llegado el momento de postular y elegir al Consejo de Estado, su Presidente, Vicepresidentes y Secretario.
Desempeñé el honroso cargo de Presidente a lo largo de muchos años. El 15 de febrero de 1976 se aprobó la Constitución Socialista por voto libre, directo y secreto de más del 95% de los ciudadanos con derecho a votar. La primera Asamblea Nacional se constituyó el 2 de diciembre de ese año y eligió el Consejo de Estado y su Presidencia. Antes había ejercido el cargo de Primer Ministro durante casi 18 años. Siempre dispuse de las prerrogativas necesarias para llevar adelante la obra revolucionaria con el apoyo de la inmensa mayoría del pueblo.
Conociendo mi estado crítico de salud, muchos en el exterior pensaban que la renuncia provisional al cargo de Presidente del Consejo de Estado el 31 de julio de 2006, que dejé en manos del Primer Vicepresidente, Raúl Castro Ruz, era definitiva. El propio Raúl, quien adicionalmente ocupa el cargo de Ministro de las F.A.R. por méritos personales, y los demás compañeros de la dirección del Partido y el Estado, fueron renuentes a considerarme apartado de mis cargos a pesar de mi estado precario de salud.


Era incómoda mi posición frente a un adversario que hizo todo lo imaginable por deshacerse de mí y en nada me agradaba complacerlo.
Más adelante pude alcanzar de nuevo el dominio total de mi mente, la posibilidad de leer y meditar mucho, obligado por el reposo. Me acompañaban las fuerzas físicas suficientes para escribir largas horas, las que compartía con la rehabilitación y los programas pertinentes de recuperación. Un elemental sentido común me indicaba que esa actividad estaba a mi alcance. Por otro lado me preocupó siempre, al hablar de mi salud, evitar ilusiones que en el caso de un desenlace adverso, traerían noticias traumáticas a nuestro pueblo en medio de la batalla. Prepararlo para mi ausencia, sicológica y políticamente, era mi primera obligación después de tantos años de lucha. Nunca dejé de señalar que se trataba de una recuperación "no exenta de riesgos".

Mi deseo fue siempre cumplir el deber hasta el último aliento. Es lo que puedo ofrecer.

A mis entrañables compatriotas, que me hicieron el inmenso honor de elegirme en días recientes como miembro del Parlamento, en cuyo seno se deben adoptar acuerdos importantes para el destino de nuestra Revolución, les comunico que no aspiraré ni aceptaré - repito- no aspiraré ni aceptaré, el cargo de Presidente del Consejo de Estado y Comandante en Jefe.

En breves cartas dirigidas a Randy Alonso, Director del programa Mesa Redonda de la Televisión Nacional, que a solicitud mía fueron divulgadas, se incluían discretamente elementos de este mensaje que hoy escribo, y ni siquiera el destinatario de las misivas conocía mi propósito. Tenía confianza en Randy porque lo conocí bien cuando era estudiante universitario de Periodismo, y me reunía casi todas las semanas con los representantes principales de los estudiantes universitarios, de lo que ya era conocido como el interior del país, en la biblioteca de la amplia casa de Kohly, donde se albergaban. Hoy todo el país es una inmensa Universidad.

Párrafos seleccionados de la carta enviada a Randy el 17 de diciembre de 2007:
"Mi más profunda convicción es que las respuestas a los problemas actuales de la sociedad cubana, que posee un promedio educacional cercano a 12 grados, casi un millón de graduados universitarios y la posibilidad real de estudio para sus ciudadanos sin discriminación alguna, requieren más variantes de respuesta para cada problema concreto que las contenidas en un tablero de ajedrez. Ni un solo detalle se puede ignorar, y no se trata de un camino fácil, si es que la inteligencia del ser humano en una sociedad revolucionaria ha de prevalecer sobre sus instintos.

"Mi deber elemental no es aferrarme a cargos, ni mucho menos obstruir el paso a personas más jóvenes, sino aportar experiencias e ideas cuyo modesto valor proviene de la época excepcional que me tocó vivir.

"Pienso como Niemeyer que hay que ser consecuente hasta el final."


Carta del 8 de enero de 2008:
"...Soy decidido partidario del voto unido (un principio que preserva el mérito ignorado). Fue lo que nos permitió evitar las tendencias a copiar lo que venía de los países del antiguo campo socialista, entre ellas el retrato de un candidato único, tan solitario como a la vez tan solidario con Cuba. Respeto mucho aquel primer intento de construir el socialismo, gracias al cual pudimos continuar el camino escogido."
"Tenía muy presente que toda la gloria del mundo cabe en un grano de maíz", reiteraba en aquella carta.
Traicionaría por tanto mi conciencia ocupar una responsabilidad que requiere movilidad y entrega total que no estoy en condiciones físicas de ofrecer. Lo explico sin dramatismo.

Afortunadamente nuestro proceso cuenta todavía con cuadros de la vieja guardia, junto a otros que eran muy jóvenes cuando se inició la primera etapa de la Revolución. Algunos casi niños se incorporaron a los combatientes de las montañas y después, con su heroísmo y sus misiones internacionalistas, llenaron de gloria al país. Cuentan con la autoridad y la experiencia para garantizar el reemplazo. Dispone igualmente nuestro proceso de la generación intermedia que aprendió junto a nosotros los elementos del complejo y casi inaccesible arte de organizar y dirigir una revolución.

El camino siempre será difícil y requerirá el esfuerzo inteligente de todos. Desconfío de las sendas aparentemente fáciles de la apologética, o la autoflagelación como antítesis. Prepararse siempre para la peor de las variantes. Ser tan prudentes en el éxito como firmes en la adversidad es un principio que no puede olvidarse. El adversario a derrotar es sumamente fuerte, pero lo hemos mantenido a raya durante medio siglo.

No me despido de ustedes. Deseo solo combatir como un soldado de las ideas. Seguiré escribiendo bajo el título "Reflexiones del compañero Fidel" . Será un arma más del arsenal con la cual se podrá contar. Tal vez mi voz se escuche. Seré cuidadoso.


Gracias
Fidel Castro Ruz
18 de febrero de 2008
5 y 30 p.m.

15 fevereiro 2008

Um menestrel de dois milênios

Texto e foto Adroaldo Bauer Corrêa



Zé da Folha não vai aos caldeirões e faustões – estes janelões dos de sempre e atualmente vitrine permanente do outro da dupla sertaneja que o fortuito desfez e da onipresente e televisamente única cantora que os não baianos conhecem da Bahia, aquela senhora que vende cerveja com as pernas pra gurizada e xampu pra senhoras incautas com mais idade que ela depois de já terem feito quase tudo para arranjar aquele cabelo sem aquela voz, sem produção e sem luz e azul de fundo.

Zé da Folha também não vai àqueles outros programas menos sutis da madrugada, que já vendem o bagaço mesmo do tope da sociedade ordinária que ainda vivemos.

Ele não me disse que não gosta de dormir tarde, mas é uma conclusão possível, dado o tamanho da jornada de palco de mais de quatro horas seguidas que faz só no primeiro turno e o aspecto saudável de suas feições já às 8 da manhã, quando chega para tomar posse de um canto no Bric da Redenção, na Avenida José Bonifácio, em Porto Alegre.

Visivelmente um homem já maduro, Zé da Folha também há algum tempo passou da idade de freqüentar programas de calouros ou ser apresentado ao Brasil que ainda suporta ver a mesma idéia mais ou menos de há 30 ou 20 anos se repetir até a náusea religiosamente aos santos sábados e domingos nem tanto na televisão brasileira, assim mesmificada embora tecnicamente uma das melhores do planeta.

Porque tal acontece já seria assunto para sociólogos ou, até, taxidermistas (lembraram de outras duas?), mas é tão lamentável que isso ainda ocorra como o caso daquela lixeira esnobe de mil reais comprada para a casa do tal reitor da capital pour quoi noblesse oblige. E nos tempos atuais, século 21, terceiro milênio já! Haja biscoitos! Refiro já a atual capital, não a Velha Cap, motivo de trocentos sambas-de-enrdo sobre a chegad da corte do joão-fujão-que-enganou Napoleão e das loucas marias.

Cabe o alerta para incautos e apressados não irem tirando conclusões abreviadas de que tudo de bom e de ruim acontece no Rio de Janeiro ou em Belém do Pará nesse momento das nossas circunstâncias. Há podres inclusive no Reino da Dinamarca, porque, fosse Hamlet, seria sincrético, como já contei pra vocês aqui, porque, como nos diz Rosane de Almeida Pires, comentando sobre o autor do texto, Cuti, também procuro "romper com a versão oficial encenada pelo discurso pedagógico da nação – que inibe a presença da diferença..." e, ainda que haja moinhos de vento, há Redenção.

Também andam desavergonhadamente metendo mulher em cadeia de homem em outros estados, também tem carnaval criativo e bonito em São Paulo e aqui e em Floripa e em Recife e em Olinda e em Salvador, no próprio Tríduo de Momo, veja só (ainda que a levada do tambor à italiana seja uma outra discussão, já para conhecedores de música, não para apenas impressionistas como eu).

Pois Zé da Folha chega cedinho e abre uma cadeirinha destas das mais comuns do povo; ajeita, abre e fixa no asfalto também um guarda-sol, arruma um cartaz minúsculo sobre a tampa da caixinha do bota-aqui-se-você gostou de ouvir e se divertiu.

foto Luciano Lanes/PMPA

Como ser humano que também é, sem que haja necessidade de qualquer ministro reconhecer, Zé da Folha se alimenta e , ao que sugere o cartazinho, é da função de artista do povo que tem vivido.

Nada me falou que não sou de atrapalhar espetáculo fazendo pergunta boba, mas intui que dali e do que faça igual em outras paragens em outros horários, tira o sustento da semana, do mês, do ano, da década, não diria do século que o homem é forte e rijo para um centenário.

Não entanto, recordo de que vejo e ouço o Zé da folha nessa função artística há bem uns 40 anos. Seja na Rua da Praia (que não tem praia, que não tem rio), onde penso que o vi pela primeira vez pelos idos de 64, 65, 66 (um mal tempo, sem dúvida alguma), seja no Bric da Redenção.

Bagre Fagundes, com Antonio (Nico) Fagundes um dos autores do Canto Alegretense (não me pergunte, onde fica o Alegrete, segue o rumo do teu próprio coração...) o segundo hino mais popular do Rio Grande do Sul – o primeiro é o da República Farroupilha, que é o oficial do estado, empatados em terceiro e quarto lugares têm-se os da dupla GRE-NAL, mas não se arrisque a decidir qual dos dois é à frente do outro que leva sova de relho ou ameaço de adaga.

O quinto é o Hino nacional Brasileiro, ainda com algum entusiasmo.
Pois tava dizendo que enquanto ouvia Zé da Folha assoviar e acompanhar-se ao violão para executar o hino, digo, o Canto Alegretense, vi o Bagre atravessar a rua, uma das pistas da José Bonifácio que se fecham ao trânsito de veículos automotores quaisquer para o pedestrianismo lerdo e lasso de velhos, moços e crianças e muitos, muitos mesmo carrinhos de bebês.

Naquele domingo vi até um de trigêmeos dum jovem e corajoso casal aparentemente feliz, com riso frouxo estampado nas carinhas alegres de pai e mãe fresquinhos. Não me pareceu ainda um riso nervoso.

Chegando ao lado outro da via, Bagre já pôde ouvir melhor os acordes ao violão e a fina melodia de sua composição assoviada em uma folha de um modo exímio pelo Zé da Folha. Pôs a mão na algibeira e puxou uma nota de dinheiro [ Aqui se diz, abriu a guaiaca] e a depositou na caixinha de coleta do cachê espontâneo, sorridente e feliz de se ver ali interpretado por tão reconhecido artista popular.

Zé da Folha tem um público fiel. Alguns ele reconhece e até chama pelo nome ou provoca pela pedida musical. A senhora loura, em esportivo traje pára e ele, incontinenti, sapeca: Aqueles olhos verdes, no assovio e no violão.

Ela permanece, após aplaude e pede outra, mais outra e põe outra nota na caixinha do Zé, o que parece faz há muito, de tanto que se conversam e mostram se gostar, o que fica evidente nos intervalos entre as músicas, que o Zé aproveita para molhar a palavra com água de uma garrafinha destas comuns de plástico transparente, mas sem rótulo que, aparentemente, Zé não é patrocinado por nenhuma cerveja ou refrigerante, ainda. Não tem camarim o Zé, nem uvas, frutas outra da estação ou toalhas brancas.

Ele pega de um ramo de árvore que trouxe de casa uma nova folha, bem escolhida, seu segundo instrumento. Com o pé direito, ele ainda bate no chão um pandeiro, somente as platinelas, sem couro, para marcar o compasso, que aqui também tem, por outras regras.

Zé da Folha tem vasto repertório para o violão que acarinha como filha dileta. Vai do tango ao bolero, do chamamé ao bugio, passando pelo vanerão até o samba-canção, o de partido alto e mesmo a bossa nova.

Se pedirem, alguns ainda imberbes e galhofeiros por provocação, também toca rock. Zombeteiro, como convém à fleuma do artista que há muito sobrevive da contribuição livre do público à caixinha, macaqueia a gurizada com uns trechos curtos de pancadões, technos e dances, essa modas ligeiras que a gurizada pega e larga como se fosse cueca usada ou chilé-balão, de tanto que muda de nome pra mesma toada quase nada musical.

Tum-tum o coração já faz desde nosso primeiro minuto de vida. Se amplificar taquicardia, dá festa, assim como para inimigo qualquer pé de galinha dá canja. Imagine-se aquelas que têm, além da adrenalina, ingredientes outros externos, digamos assim, a incentivar adrede o organismo...

Zé da Folha estava de costas, percebeu o Bagre aparentemente pelo entusiasmo do público que aplaudiu e pôs o canto na melodia (porque o Zé só toca, assovia e faz marcação, lembram?). Isso talvez seja a principal razão do sucesso do programa deste artista: o povo vai ali, tem uma base musical de qualidade, variada, um intérprete cordial e gentil, bem-humorado, que chega a palco antes do público. E ele mesmo, povo, canta.

foto Ricardo Stricher/PMPA


Pois enquanto agradecia o aplauso, Zé só se apercebeu que era de fato o compositor da música que acabara de tocar quando esse ia já há alguns metros dali, seguindo o passeio aquele que já lemos antes nesse texto, que as pessoas, a maioria, eu entre elas, vamos ali para caminhar, ver gente mais bonita que a gente, que melhora o dia, encontrar outras pessoas amigas, tomar chimarrão em pé, uma moda criada ali no Bric há mais de 25 anos.

No Rio Grande se fazia por uso era roda-de-chimarão, em bancos toscos de madeira no galcão das estâncias antigas ou em cadeiras (amigo, boleia a perna, puxe o banco e vai sentando, encosta a palha na orelha, que o amargo, vou cevando).

Essa modernidade de tomar chimarão em dupla, trio, quarteto, quinteto ou mesmo só, todos em pé e a passeio, é coisa de guri daquele tempo. Mas pegou.

Quem sabe algumas já batidas e por tal inesquecíveis peças de raves ou bailes funks venham a ser assoviadas em praça pública, cantadas pelo povo, acompanhadas ao violão acústico, como costuma acontecer com as canções que permanecem no imaginário popular e reaparecem nas praças dos burgos desde o já imemorial tempo dos menestréis medievais no milênio passado.

Pela aparente boa saúde do Zé da Folha, por muitos e muitos anos mais isso vai ser o ofício dele (evoé!) ali mesmo no meio da rua, no meio do povo, sob aplausos entusiasmados e sorrisos gentis dos passantes e alguns ficantes como eu.

Depois de um tempo que nem senti passar, em que também dei minha cota para o almoço do dia do nosso artista, além de vender um exemplar da minha novela para uma das fãs do Zé, curiosa em saber de quem era e o que era aquele livro que eu tinha nas mãos, pois após isso retomei o passeio aquele de que já falamos e tive uma certeza a poucos metros da berlinda do Zé da Folha.

Vendo uma dupla de meninos sentados no meio-fio, um outro proscênio de artistas populares, cantando alto, ainda sem muita afinação, se acompanhando ao violão, músicas que já existiam antes de eu ter nascido. A certeza que tive é de que permanece em cultura num lugar aquilo que o povo do lugar queira e preserve e defenda... Para poder assoviar, cantar junto e aplaudir.
Zé da Folha, como o gato ao tigre, não deve ter dito tudo àquela cigarra do La Fontaine.
Eu pelo menos já o vi mesmo nos invernos ali. Quando chove muito, mesmo sem nos falarmos, combinamos de não ir. Estou também certo de que vamos continuar nos vendo enquanto vivermos.
E os meninos, talvez por muito pobres e ainda crianças, já estão formando seu público.
Merde!